0101 Failure – Prelúdio

Apenas mais um dia em uma ‘big-tech’ fabricante de games em algum lugar no meio do caos…

-Bom dia sr. Renato. Tudo pronto para rodar os testes na versão Beta do “CITY IN SANE”, porém o protótipo do VR óculos  ainda não está 100% concluído, então ainda será necessário usar os óculos VR de 1a. geração.

-Cacete, Paulo!!! Achei que tinha mandado vender esses óculos, ainda tem os 5 ai?

-Nós anunciamos, mas ninguém quer pagar o valor e acabou ficando desatualizado.

-O sr. lembra que no início do projeto definimos nas regras do Crowdfunding a entrega de brindes sorteados aos participantes se atingirmos um valor determinado? Bem, nós batemos a meta e o time de marketing acha uma boa inserir como presente os óculos VR que estão encalhados aí,  só para os que estiverem comprando a primeira versão do jogo.

-Bem, esses óculos foram um investimento que resultou em nada mesmo! No fim, pagamos para desenvolver o nosso próprio óculos de VR que serão muito mais leves e baratos.

-Sabe o que é pior, Paulo? Quando compramos, deixamos os 5 óculos na mão daquele neurocientista e do amigo engenheiro dele para ver a viabilidade de integrar com o neuralink em algum momento, então eles abriram os aparelhos, tiraram os lacres e depois ficaram doidos da cabeça e simplesmente resolveram ir embora da empresa deixando a gente na mão, além de tudo perdemos a garantia dos equipamentos. Baita confusão!

-Sr. Renato, ouvi dizer que  a empresa foi processada pelas famílias deles, é verdade?

-É, mas não conseguiram provar nada! Eles ficaram doidos mexendo com esses óculos com um jogo experimental deles. Nem faço ideia do que se tratava! Estava bem claro que não era para usar o dispositivo por mais de 1 hora por dia. Eles ficavam se gabando que era melhor lá do que aqui… Fritaram o cérebro!

-Bom, Paulo! Chega de papo, já que é o que temos, me dá isso aqui que eu quero experimentar a imersão do jogo, textura, fluidez é a trava de segurança!

-OK chefe! O timer está “setado’ para 15 minutos e o seu avatar já está configurado. Ele é um detetive da polícia e o mapa permite chegar só até o túnel de acesso ao outro distrito…

-Chega Paulo! Dá o play aí nessa bagaça!

14 minutos depois, o alarme do sistema foi ativado, retirando a imersão e desativando a experiência do áudio no ouvido de Renato que, então, retira o dispositivo da cabeça.

Com os olhos um tanto quanto perdidos ele foca no rosto de Paulo que estava sentado a frente do computador observando a movimentação do jogo através de um monitor.

O jogo é tão viciante que o alarme foi uma solicitação da equipe de psicólogos que compõem o time em que estavam roteiristas, artistas, designers e a equipe de T.I. à qual Paulo faz parte. A preocupação era mais com a restrição do jogo para crianças, mas adultos poderiam se viciar facilmente e por isso uma versão Beta seria vendida como pré lançamento para apenas algumas centenas de pessoas e apenas 5 delas receberiam a imersão completa com os óculos de realidade virtual, se reportando diretamente para a equipe de desenvolvimento e suporte em busca de bugs e melhorias para a versão final.

-Cacete, Paulo! O negócio é muito legal! Você me viu? Viu eu colocando a arma na cara do bandido lá?

-Sim, mas era a vítima!

-É, mas e depois que eu peguei a viatura e persegui aquela ambulância roubada? Você viu eu atirando no pneu, o negócio capotou! UAU! Foi animal!

-É eu vi, mas a ambulância estava numa missão em que o Rogério e o Felipe estavam e tinham que levar um paciente para o hospital! Eles estão testando as missões em conjunto lá na sala de desenvolvimento!

O chefe olha pelo vidro da sala dele, onde estavam testando o jogo com o óculos VR, e se direciona para a sala de desenvolvimento, de onde  Rogério e Felipe, os programadores seniores da equipe, saem com as caras bem emburradas!

-Ah, dane-se… Como eu ia saber?

-Mas e aí chefe? Gostou?

-É muito legal! Senti alguns pontos em que a transição de ambientes demorou para renderizar e temos que corrigir algumas texturas, mas está muito bom. Esse negócio do alarme foi uma ótima sacada. Dá para se viciar muito fácil num mundo virtual desse jeito.

Com a aprovação do CEO da empresa o jogo apelidado de C.I.S. estava à poucos dias de ser enviado para cerca de 150 usuários de teste com acesso à todos os mapas, 1500 usuários com acesso restrito ao primeiro mapa e apenas 5 com imersão total, recebendo o jogo e os óculos VR modificados por 2 ex funcionários desaparecidos.

A alteração das especificações dos óculos de VR não trariam problema algum se um programador em específico, introspectivo, quieto e muito talentoso não estivesse com ideias diferentes para um easter egg dentro do C.I.S!

A ideia de colocar coisas escondidas dentro dos jogos não é novidade desde 1979 com o jogo do ATARI chamado ADVENTURE que na ocasião foi a forma do programador do jogo colocar seu nome, fazer seu legado para sempre.

Diego era um desses caras obcecados e quando foi chamado para trabalhar no desenvolvimento do C.I.S. deram à ele a responsabilidade de criar os perfis dos NPCs do jogo, e juntamente com a equipe de roteiro eles estabeleceram todos os personagens que seriam categorizados como protagonistas, secundários e coadjuvantes.

Cada grupo de NPC deveria ter uma interface de IA capaz de interagir com os jogadores de forma bem convincente, mas sempre tendo comportamentos padronizados. A prática envolve economia de recursos computacionais e o próprio tempo de desenvolvimento.

Mas não para o Diego, ele queria colocar algo só dele nesse jogo, algo que realmente mudaria toda a experiência quando um jogador se deparasse com sua surpresa.

Diego era muito conhecido na equipe por ter trabalho com o desenvolvimento de IAs avançadas que basicamente estavam a um passo de se tornarem autônomas e desta vez ele seria capaz de colocar sua base de código, sua obra prima dentro do jogo mais aguardado.

Dentre os NPCs, Diego decidira que escolheria 5 personagens distintos, sem relação, que seriam ativados pela experiência do usuário ao se depararem com eles em ocasiões extremamentes específicas, então ele escolheu 3 personagens masculinos e 2 femininos com a automação de uma IA tão avançada que seria uma surpresa para o jogador, fazendo-o pensar que estaria conversando com outro jogador online.

Mas como escolher esses personagens era o grande dilema, como deixar esses NPCs extremamente inacessíveis?

Alguns dias se passaram, debruçado sobre o storyboard do jogo e então a ideia veio em uma simples comparação com seu local de trabalho.

A coisa mais difícil para qualquer um era conseguir uma hora para falar com o Sr. Renato, ele só fala com quem quer e quando quer, então era óbvio: Colocar a IA mais avançada em NPCs com altos cargos dentro do jogo.

O dono de uma empresa, o chefe de uma organização criminosa, uma top model, um presidente do banco da cidade, a esposa do prefeito da cidade. Esses foram os NPCs escolhidos e programados para acessar uma rotina tão poderosa que, se um jogador pudesse falar com eles, seria impossível distingui-los de uma pessoa de verdade. Nenhuma interação seria igual a outra, nunca!

Diego fez um projeto magnífico, o que ele não sabia é que aqueles óculos VR modificados tinham uma função e uma interface diferente e com consequências imprevisíveis.

Todo hardware possui somente uma especialidade, ou ele é um hardware de entrada (I) ou ele é é para saída (O), então um mouse, um teclado um scanner, um microfone ou uma câmera são Inputs e um monitor, um fone de ouvido ou um óculos VR, são Outputs, mas porque dois gênios meios malucos alteram como funcionam os padrões dos óculos de VR e criaram uma interface de I/O no mesmo dispositivo, ninguém jamais poderá responder.

A primeira impressão que se poderia assumir é que eles queriam escapar da realidade e ir para uma dimensão digital.

Anos atrás a equipe do neurocientista que trabalhava com o óculos VR estudava uma forma de converter sinais digitais para sinais ópticos e enviá-los diretamente ao cérebro humano através da íris, a ideia era implantar memórias falsas nas pessoas, criando a ilusão de experiências reais, mas que nunca existiram.

A ideia de poder criar um equipamento que pudesse transcender a existência entre o real e o virtual estava prestes a tomar proporções extremamente grotescas e com consequências inimagináveis.

Continua…

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